quinta-feira, agosto 13

Alcunhas

Apelido, para ser assim, apelido mesmo, de verdade, tem que colar rápido e com naturalidade, feito ranho em azulejo. Precisa varrer do mapa o nome de batismo. Apelido bom só devolve ao dono o nome que mamãe tanto fez gosto quando o sujeito bate as botas, esticas as canelas, inspira.
Meu irmão, por exemplo, é Pinto. Antes de o chamarmos pelo nome, alguém disse: “Parece um pintinho amarelinho.” Pronto, estava lá o Pinto. Para voltar a ser chamado por Flavio foi morar lá onde o Danado perdeu as calças. Ainda assim, quando está de férias e alguém lá dos infernos liga, a gente, involuntariamente é claro, entrega a rapadura:
- Alô.
- Oi...
- Queres falar com quem?
- Com o Flavio.
- Pai ou filho?
- Filho, eu acho.
- Ah, é com o Pinto... Momentinho. Pintô... É pra ti.

Éramos pródigos em apelidar. Os codinomes variavam conforme as características –invariavelmente as piores –, habilidades e esquisitices de cada um, somadas aos dias que se viviam.
Exemplificando: o Zulu, que na infância havia sido Péle, era Zulu porque todo mundo via a ignomínia, a merda se melhor lhes soa, do Apartheid pela TV. O Buléu era Buléu, por conta das acrobacias na bicicleta. Corajoso, é bem verdade, voava alto sempre. No ar era um espetáculo, mas na aterrissagem, feridas e ossos partidos.
O lance, é que esse negócio de apelido, quando pega, pega e já era. Justificá-lo pouco importa. Como esclarecer na estaca do condizível ser o Salada, o Salada? Existem coisas que ninguém explica. O gozado é que hoje o sujeito é chefe de cozinha em um navio de cruzeiro. Vai saber!
O caso do Pelado seguia a mesma incógnita, só que esse, apesar de continuar viajando, não embarcou em navio algum.
Outros qualificativos, porém, não tinham mistério. O Foguete era é ruivo, cabeludo e avoado. Alguém precisa fazer alusão à altura para que se entenda o caso do Tatu? Ou do Farmácia, que vivia amassando e cheirando hipofagin? Ou mesmo o do Fanho, que até poderia ter dado um nó na afronta, mas como desgraça quando dá na telha de ser desgraça não tem jeito, mesmo com toda grana e cirurgias, permanece falando pelo nariz.

Já outros apelidos são não resistem assim ao tempo, e a alguma força de vontade . O Quatorze, coitado, envelheceu, e agora vira o rosto quando gritam Quarenta. O Gordo, não acreditaríamos na época, emagreceu, ficou bonito, e agora trepa com umas magras que nem na punheta ousava comer. E o Barata, que apesar de continuar branco feito vela, acalmou as incursões pelas sarjetas. Mas isso, diga-se de passagem, muito se deve a ausência prolongada do Cure no Brasil, e da decadência do Bom Fim. Sem falar na dificuldade de hoje em dia, para quem não tem plano de saúde, de descolar umas cartelinhas tarja preta.

Não obstante, apelidos nem sempre flertam com caricaturas. Vez em quando, imergem por antítese. O Loloco foi e continua a ser o cara mais careta que conheci na vida, apesar de já ter o corpo todo pintado numa época em que só a âncora do Popeye passava batida. A mesma coisa o Aloprado - obelisco de sobriedade.

Pondo fim às reminiscências, foram tantos, que não posso seguir adiante sem incorrer no risco de tornar-me enfadonho. Para acabar só lhes peço um bocadinho de paciência e ritmo.

Em meia dúzia de fôlegos:

Aranha, Jubi, Bolo, Zoio, Laranja. Tofo, Dinho, Báro, Feice, Cenoura, Baga, Manduca, Banana.

Um respiro. Segue em frente. Logo acaba.

Prego, Escurinho,Maradona, Maneco, Magu, Nego, Seco, Colméia. Paranga, Taquara, Goiaba, Caverna, Jacão, Assassino, Tomate, Conha, Beterraba, Alemão, Pardal.

E entre tantos muitos outros... Paspalho, um abraço.

Circo - panturrilhas e olhos puxados



Impérios, senhores, lacaios, mulas, homens vencidos. Todos tropicaram nos cascalhos em busca da seda. Abro mão da luz e perscruto os traços. Tendo descobrir se vieram do frio das bétulas ou do mormaço dos bambus.
Os olhos puxados se parecem tanto quanto os redondos nossos. São mui, mui diferentes, todos eles.
Os corpos de tanta força contra a gravidade chegam ao hiato donde mora a leveza.
São elásticos... Reviram-se, dobram-se, desenroscam-se. E a gente quase estrábica já não sabe onde começa ou termina o homem. Nada de novo, se o porém fosse filosófico. Não obstante, se tratando de pele, músculo e osso, urge logo ali a obrigação do desenozar-se. Pouco importa o intricado do emaranhado. Ou a coluna se recompõe ou termina num esquife. O resto é conversa mole. Patatis, patatás, teretetés de quem mal se estica ou encolhe, não vai nem fica, encaroçando a vida quasímoda.

E as mulheres...
Que lindas, que fortes. Ancas, cada uma das laterais nas ponteiras do osso, entrosam tórax e pelve num lacete. Coxas rijas, panturrilhas filhas da rocha dura. Antebraços de ópio e descaminhos.
Tantos membros de disciplina, de borracha, de fibra, de plástica... Tudo bem torneado.
Volúpia (!), que cheiro bom tu tens.