sexta-feira, janeiro 28

Crueldade



Cruel foi Pizarro e depois Custer, espalhando cobertores de bolhas e febre.
Cruel foi Madre Tereza ao prolongar a vida desgraçada do desgraçado.
Cruel foi Gandhi ao incitar muçulmanos e hindus
A marchar em direção as linhas de perucas brancas e coletes vermelhos..
Cruel foi a minha mãe ao usar mertiolato em detrimento
Do mercúrio para desinfetar e cicatrizar minhas feridas.
Cruel é quem impõe a canga ainda que para
Carregar o trigo até a criança que vai espichando sob as telhas da casa.
Cruel é quem borrifa o inseticida nas folhas da joaninha,
Nos troncos da cigarra, nas trilhas da saúva.
Cruel é quem desaloja a pupa do roda forro para ela não atrapalhar
A simetria das linhas da sala de estar negando a vida a borboleta.
Cruel são as opções –
O acerto e o erro.
Cruel é a covardia do medo da escolha.
Cruel é não ter como saber se a escolha do agora será pujança ou desgraça amanhã.
É não poder retornar ao ontem para redirecionar o logo depois e o mais adiante.
Cruel é nascer sob a condição de morrer.
É estar vivo sob as ladainhas de como se deve viver para bater as botas e reviver.
Cruel é ter que andar descalço no asfalto,
Ler a placa de “Não pise na grama”,
Ser educado por apostilas.
Cruel é furar as orelhas da guria que nasceu e logo depois afoga-la por batismo.
Cruel é estar exposto aos carrapatos, aos mosquitos, as mutucas,
Ao parasita lambedor de sangue -
A toda a gente que chupa o teu sangue e te rouba a alma.
Cruel é o enganador, o medroso, o mentiroso.
Cruel é fazer o outro sofrer.
Cruel foi ter feito o outro sofrer.
Cruel foi ter dado as costas a um grande amor.

Nenhum comentário: