sexta-feira, maio 27

Esfíncter



Ando numa merda desgraçada. Daquela merda que cheira feito cu em cancro.
Carro velho quebradiço, calças surradas, cuecas sem elástico.
Taxas de luz e água sempre atrasadas. Tem mês que quando aponto na esquina já miro de longe a caixa de luz para ver se o pontinho vermelho continua piscando. Se pisca, respiro aliviado, já sei que vou acender as lâmpadas e tomar banho quente.
Do contrário, velas e ducha fria. Tropeços e impropérios.
E vós sabeis, ou não, que quando a bosta chega à tamanha grandeza, a vida torna-se uma fossa mal cavada fermentando um caldo grosso que respinga feito um vulcãozinho raso na planície, fumegando pequenas tragédias cotidianas.

Quando a coisa chega a esse ponto tudo vira susto.
Se tilintar o telefone, tu pulas.
Se a cachorrada empreender arranque no quintal, tu pulas.
Se um galho arranhar a janela, tu pulas.
Se um fusca estourar um peido na redução brusca das marchas, tu pulas, mais ainda.
Mesmo que tu não tenhas nascido de susto e que, portanto, tu não sejas por natureza assustado, tu pularás, creias nisso.

Engraçado é que já houve uma época em que eu associava essa condição fecal ao uma espécie de romantismo, esperando dela o útero da musa.
Engraçado, e muitos tapas em minha cara, é que nessa época eu não escrevia nada, ou escrevia um monte de besteiras. Tantas como agora.

É fácil ser romântico quando as coisas não efervescem ou fedem ao sol.
É fácil quando as coisas continuam te permitindo o sono.
Desejar o esterco para que ele seja gatilho de inspiração é uma coisa.
Já ele esmagado por entre o comprimento dos dedos (?), é bem outra.

Às vezes tenho vontade de armas o tabuleiro para o copo, ou dar um pulo num centro espírita. Chamar para um colóquiozinho, Milleres, Bukoviskes, Rimbaudes, Plínios Marcos.
Seria só para ter certeza que muito antes de mim eles já haviam sacado tudo há um tempão, e por isso escreviam.
A merda fede, não digo novidade. É só, que quando ela se esparrama por certas páginas tem o dom de camuflar-se e parecer apetitosa.

Quando o copo, se o copo deslizar, eles mandar-me-iam tomar no cu, estou certo. Arremessariam- o contra a parede, enterrariam os dedos no meu rabo, e me fariam lamber a casca de feijão mal digerida que estava grudada na parede do meu reto.
- Qual merda o quê!?, gritariam
- Não basta sentir o cheiro dela, otário, é preciso comê-la. Enfie no cu os cacos do copo junto com o teu médium, vociferariam.
- Coma o que tu cagas ou cala-te, maquete de pequeno mentecapto. Engula aquilo que evacuas ou te banharás eternamente com o que espirras com a força do teu esfíncter.

É.... Eles diriam...
É que a merda anda tanta.....

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