quarta-feira, julho 6

Casa



Estou em casa e seguro,
Mas não tenho uma foto tua.
Pouco importa.
Do que menos preciso agora é
De um retrato para te enxergar.
Estás estampada nas paredes,
Cantos, lençóis e cortinado.
Vejo-te e te sinto por todos os lados.
Os meus pulsos latejam o teu nome e
Minhas vértebras esticam-se por teu corpo.

Não compliquemos as coisas.
Eu deveria ter ido,
Tu deverias ter vindo.
Os dias não são carimbos, chancelas ou portais
Que se abrem ou se cerram.
Os dias trasladados sou eu e és tu – junto,
E nos pertencem para fazermos
Deles o que bem entendermos e desejarmos.

Somos o dia, a cada dia, de carne e de osso.
Ensolarado ou plúmbeo;
Rajado, pardo, malhado... Ou lambuzado de muitas tintas.
Estancado por calmarias de Jonas,
Ou acelerado por ventanias que bufam
Velas por todos e quaisquer caminhos.

Não compliquemos as coisas.
Os dias não são correntes, cordoarias ou garateia
Que se amarram ou prendem-se em arrecifes.
Os dias girados sou eu e és tu – junto,
E devem-se curvar a nossa benção para fazermos
Deles o que bem entendermos e desejarmos.

Somos o dia, a cada dia, de veia e de tripa.
Impetuoso ou reticente;
Desconfiado, convicto, trêmulo... Ou de si bem certo.
Incrustado e lento e medroso,
Ou tocado por remos e músculos que
Arvoram-se todos por quaisquer caminhos.

Não compliquemos as coisas.
Eu deveria ter ido,
Tu deverias ter vindo.
Só queríamos, um e outro, eu sei,
Fomentar a saudade, a tesão, as mãos, por mais um dia.
Acontece que parece que já vamos passando por isso
E o que nos compele e resta
É alimentarmo-nos juntos.

Não somos o gás em letreiros ou meia luz e bola de roleta.
Somos o passo que chega e anda,
E que depois se põe e de novo
Nasce a cada nosso santo dia.

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