quarta-feira, junho 8

Ressurreição


Ouvi dizer que alguns bons amigos andam dizendo que estou diferente,
Mas eu acho que só estou de retorno.
Saindo das ravinas de águas mau cheirosas,
Deixando os guinchos das hordas baixas para trás.

Os mares andaram turbulentos e espumados. Infindáveis monstros de sal marinho se sucederam a abalroar a minha nave. Uns tinham olhos e narizes enormes, outros, couro e escamas de serra. Alguns tinham presas tão longas que poderiam triturar rochas e montanhas. Tinham tentáculos, caudas de rebenque, garras e esporões do tamanho de arcos.

A terra andou deserta, seca e erodida. No horizonte nem miragem se avolumava.
A planície se alongava num alaranjado turvo exalando um mormaço pestilento.
Os lábios deram lugar às feridas, a testa as bandagens, as orelhas e nuca a carne morta.
Os olhos eram pus, a pele um derretimento - o corpo, todo uma carcaça.

Ouvi dizer que estou diferente,
Mas eu acho que só estou de retorno.
Saindo do covil das almas mortas,
Deixando os guinchos das hordas baixas para trás.

Medusas, Minotauros, Hidras, Krakens... Senhores do inferno.
Derrotados, viciados, ladrões, assassinos, putas...Cobradores de impostos.
Bruxas, demônios, leprosos, mercenários... Vendedores de relíquias.
Escuridão, azia, vômito, aneurismas... Zeladores de incongruências.

Casas mal vividas, salas repartidas, quartos mofados, camas vazias.
Plagas desertas, córregos estanques, folhas secas, capim queimado.
Praça sem coreto, chafarizes oxidados, bancos apodrecidos, gangorras trincadas.
Alianças equivocadas, ouro de mentira, filha feita com o imprestável.

Ouvi dizer que alguns bons amigos andam dizendo que estou diferente,
Mas eu acho que só estou de retorno.
Saindo das sendas do mau feitiço,
Deixando os relinchos das hordas baixas para trás.

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